Transtorno Bipolar - alguns esclarecimentos. E chega disso!Por Suzi Hong
Decidi, algum tempo atrás, que evitaria escrever sobre o transtorno afetivo bipolar (TAB, a.k.a. psicose maníaco-depressiva), sobre as crises alternadas de depressão e euforia, efeitos colaterais do tratamento, yada yada yada.
Porém, o comentário de um leitor sobre meu post que trata de sobrevivência (sem nenhum cunho sociológico ou pretensões variadas), me fez pensar que seria necessário esclarecer alguns aspectos do tal transtorno. Reproduzo, a seguir, o trecho do comentário de 03.03.2007 que deu origem a este post.
"(...) Gosto da sua coragem de admitir seu transtorno bipolar, embora acredite que mais coragem é viver sem medicação, afinal se todo mundo vivesse chapado nunca teríamos Faulkner, Hemingway(tudo bem que eles bebiam bastante, mas existe uma certa nobreza na embriaguez, na medicação apenas um indivíduo abrindo mão da sua autonomia, mas esse papo fica para uma outra oportunidade) (...)."
[Respiro fundo.]
Vamos lá. O transtorno bipolar é uma doença que, como qualquer outra, precisa ser corretamente diagnosticada e tratada com medicamentos. É uma doença mental? É. O cérebro produz de forma atípica alguns neurotransmissores fundamentais para nossa saúde mental. O motivo? Ainda não se sabe com precisão. É genético? Os estudiosos entendem que sim. Pode incapacitar a pessoa de exercer suas atividades rotineiras? Quem sofre de TAB é retardado? Não.
Mas o pior de tudo é: não há cura para o TAB, apenas controle. Tal qual uma diabete, que precisa ser controlada com injeções de insulina.
Existe ainda um grande preconceito ou uma total ignorância sobre o que é o TAB e seus efeitos e sintomas, que podem ser devastadores. O paciente de TAB, se mal diagnosticado ou submetido a tratamentos incorretos, pode torrar todo o seu patrimônio em incríveis três semanas, trabalhar por 48 horas seguidas sem se cansar, emprestar as cuecas para o pior dos amigos ou, no outro extremo, ficar impossibilitado de trabalhar, parar de comer por dias e dias, não tomar banho por semanas, não falar com absolutamente ninguém, chorar até cansar e, falando um português bem claro, o paciente de TAB pode cometer suicídio.
Dito isso tudo aí em cima, posso dizer que eu sofro de um tipo de transtorno bipolar mais ou menos incomum: sou TAB com ciclagens ultra rápidas (ou seja, meu humor oscila muito mais vezes em um certo intervalo de tempo, se comparado ao humor dos bipolares “clássicos”). Isso quer dizer que o tratamento convencional, à base de lítio, não funcionou comigo. Tentei algumas combinações de medicamentos, fiquei internada dois meses em uma clínica psiquiátrica, fui submetida a várias sessões de ECT (eletroconvulsoterapia - eletrochoques, para ser mais clara), tudo para evitar o tratamento mais indicado para o meu tipo de TAB. Por quê? Apesar de eficaz, possui muitos efeitos colaterais.
O resultado disso tudo é que tenho que fazer hemogramas mensais, dormir pelo menos 9 horas por dia e controlar o apetite, já que engordei uns 20 quilos (ainda bem que eu era magérrima antes de iniciar o tratamento). Sem falar na grana que gasto todo mês com remédios (caríssimos) e sessões de terapia.
Então... o meu leitor sugere em seu comentário que: (a) dependo dos remédios, (b) falta-me coragem para viver sem eles, (c) eu vivo chapada por conta do tratamento. Sem falar da sugestão de que o mundo não teria mais Faulkners ou Hemingways se todos os talentos resolvessem viver “chapados” com medicamentos indicados para os mais variados tipos de transtornos da mente.
Pois esclareço, e perdoem-me os leitores pelo o que será um desabafo, que o comentário transcrito acima foi inadequado, típico das pessoas que desconhecem, infelizmente, o que é o TAB, a depressão crônica, a esquizofrenia, a síndrome do pânico, TOC – transtorno obsessivo compulsivo ou que enxergam uma certa beleza na afirmação de que "viver é sofrer", de Arthur Schopenhauer.[...] CONTINUA
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